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Normas  universais sobre mediação de conflitos

Rêmolo Letteriello

As considerações que seguem resumem, de forma brevíssima,  um  trabalho que teve  por  escopo analisar o desenvolvimento da  mediação, a partir da criação dos regimes legais, e revelar os principais modelos aplicados no universo das nações antigas e modernas, afastada qualquer pretensão de esgotar o assunto.

Embora tivesse sido utilizado como meio pacífico de resolução de conflitos, o instituto da mediação há poucas décadas passou a ser difundido e institucionalizado nos países de expressiva significação no mundo.

Realizei  uma extensa pesquisa no conjunto de regras de 66 países para conhecer os pontos convergentes, as diferenças e, sobretudo, os princípios adotados para a sustentação desse notável instrumento de resolução de controvérsias e de pacificação social..

O estudo do direito comparado permite identificar os pontos de excelência dos mais diversos sistemas existentes e conhecer a metodologia empregada no seu funcionamento.

Vale a pena transcrever breve trecho do pensamento do notável   Prof. Haroldo Valladão sobre a relevância do Direito Comparado, em trabalho publicado na Revista de Informação Legislativa, n. 30, pág. 14, intitulado O estudo e o ensino do Direito Comparado no Brasil – Séculos XIX e XX”. Assim concluiu:

Eis aí o alto destaque dado ao Direito Comparado, uma das quatro coordenadas fundamentais do direito.

     É verdadeiramente, de sumo valor, pois nos traz a grande e decisiva lição, a da experiência paralela e próxima e, sobretudo, atual e viva, desde que realizada por nossos semelhantes, pelos estrangeiros, que são nossos pósteros no espaço.

     Mas, fazer Direito Comparado é estar no apogeu do pensamento contemporâneo.

     O Direito Comparado é a grande forma da comunicação social, fazendo com que todos os povos, nações, Estados, regiões, religiões, raças, se conheçam mútua e profundamente e se compreendam.

     E nessa comunicação dialoguem e se amem para a realização do ideal jurídico de nossos dias, de um direito da integração, comunitário, em que todos trabalhem e lutem conjuntamente para a felicidade e sobrevivência de todos e não a de apenas um grupo de privilegiados.

     O Direito Comparado realiza, assim, a Justiça, e realizará a Justiça Social, pelo democrático sistema dos vasos comunicantes, pois diminuindo e afinal suprimindo as distâncias, estabelece a perfeita igualdade.

     Enfim: Direito Comparado é comunicação, diálogo, integração”.

Na investigação feita, foram ajuntados os exames das especificidades que envolvem o instituto, iniciando sempre com as considerações a respeito da sua institucionalização. Nos países que adotam esse meio de solução de conflitos, foi ele instituído ou por lei ou por diferentes atos normativos, sujeitando-se, pois, à regulamentação estatal. Cabe anotar que a intervenção do Estado é salutar, na medida que impede a difusão desordenada de uma atividade de tão grande significado e importância para a cultura da pacificação social. Não teria sentido que, importando-se com o relacionamento humano e a par de disciplinar os métodos adversariais de solução de conflitos (com a interferência do Poder Judiciário e da Arbitragem) e não adversariais (pela utilização da negociação e da conciliação), o Estado deixasse de regulamentar igualmente, a  alternativa da mediação.

Foram abordados outros temas de significância ligados ao instituto, como âmbito de aplicação do sistema, mediação judicial e extrajudicial, prévia, voluntária e privada, processo e etapas do procedimento, acordo e efeitos da sua homologação, mediador judicial e extrajudicial, público e privado, sua formação, capacitação, credenciamento, registro, fiscalização e controle da atividade funcional, e organismos e instituições prestadoras de serviços de mediação.

Dos 66 países analisados, apenas 11 não contam com leis específicas disciplinando a mediação.

Alguns contemplam o instituto através dos seus códigos de processo civil ou de atos normativos das cortes de justiça. Outros, como a Austrália, editaram regulamentos  que orientam os mediadores e profissionais privados voltados à mediação, sobre as normas a serem aplicadas no procedimento, visando a sua padronização em âmbito nacional.

Na Dinamarca a mediação é realizada pela Igreja, em casos de separação e divórcio, sendo o processo regido pela chamada Lei sobre o Matrimônio.

Há países em que, não havendo legislação, as regras são estabelecidas por organizações privadas ou Centros de Mediação, como é o caso do Egito.

Os regulamentos que fazem alusão aos princípios básicos da mediação elegem, quase uniformemente, aqueles que foram consagrados pela doutrina e previstos nas legislações pioneiras que ferem essa matéria. Tais princípios universalmente aceitos e que devem ser rigorosamente observados são os da boa-fé, da voluntariedade, da confidencialidade, da imparcialidade do mediador e da igualdade de tratamento das partes.

Um dos princípios de maior relevância é o da confidencialidade, tanto que é o único a ganhar destaque na Directiva 2008/52, diploma maior que regula a mediação civil e comercial nos países da Comunidade Europeia. Nesse estatuto está prescrito que tendo em vista que a mediação deve efetuar-se de maneira que se preserve a confidencialidade e o sigilo, os Estados membros garantirão que nem os mediadores nem as pessoas que participam do procedimento respectivo estejam obrigados a declarar, em processo judicial ou arbitral, sobre informações derivadas de um procedimento de mediação ou relacionadas com o referido processo.

O princípio da confidencialidade, ainda é considerado um dos mais determinantes para o bom êxito da mediação, na medida que, explicada às partes que tal princípio será rigorosamente  cumprido e  estando elas seguras da manutenção de absoluta reserva sobre todo o ocorrido no procedimento, induvidosamente se sentirão mais livres e soltas, facilitando, sobremaneira, a atuação do mediador.

As regras que tratam do mediador estabelecem requisitos mínimos para o ingresso dele nos cursos de formação, reclamados outros quando do credenciamento que o habilita ao exercício das atividades de mediação.

Geralmente, variando de legislações, umas para outras,  se exige título de conclusão de curso superior, experiência de exercício profissional na área, comprovação de idoneidade e de que não tenha respondido a processos criminais, disciplinares ou administrativos, nem  sofrido  sanções correspondentes, bem como apresentação de garantias de independência e imparcialidade, etc.

As regras concernentes à suspeição ou impedimento do mediador, são essencialmente as mesmas que se aplicam aos juízes e estatuídas nos códigos de processo civil; segundo disposições quase sempre inscritas nos códigos de ética ou de conduta, o mediador nomeado ou escolhido deve informar, imediatamente, a existência de qualquer causa que possa torná-lo suspeito ou impedido, comprometendo a sua independência e imparcialidade, impossibilitando-o, assim, de atuar no caso a ser mediado.

Nos sistemas examinados, quando se referem aos princípios a serem cumpridos pelo mediador no desenvolver do procedimento mediatório, ganha destaque o que diz respeito à confidencialidade, considerado pela doutrina universal como um dos mais determinantes para o bom êxito da mediação, na medida que, explicada às partes que tal princípio será rigorosamente  cumprido e  estando elas seguras da manutenção de absoluta reserva sobre todo o ocorrido no procedimento, induvidosamente se sentirão mais livres e soltas, facilitando, sobremaneira, a atuação do mediador.

Relativamente à formação do mediador deve-se fazer, porque pertinente, uma breve digressão, lembrando o que ocorreu no Brasil, recentemente, com a edição da Lei n. 13.140/2015, que instituiu o marco legal da mediação no país.

A lei específica, prevendo duas categorias de mediadores, os judiciais e os extrajudiciais, fixou, para  a atuação dos primeiros, uma série de exigências, tais como, graduação em cursos de ensino superior de instituição reconhecida pelo Ministério da Educação, capacitação em escola ou instituição de formação profissional, reconhecida  pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados ou pelos tribunais, determinando, ainda, a satisfação de requisitos mínimos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça. A legislação obrigou os tribunais a criar e manter um cadastro atualizado de mediadores habilitados e autorizados a atuar em mediação judicial, bem como a regulamentar o processo de inscrição e desligamento de seus mediadores. Já com relação aos mediadores extrajudiciais, a lei, em um único e singelo dispositivo (art. 9°), estatuiu que qualquer pessoa capaz, que tenha a confiança das partes e se julgue capacitada a mediar, pode atuar como mediador, independentemente de integrar qualquer organização, entidade de classe ou associação,  ou nelas encontrar-se inscrito.

Ao assim proceder, o legislador brasileiro cometeu gritante aberração jurídico-política, posto que, essa regra, induvidosamente, provocará a banalização das mediações privadas, por conta de que os serviços poderão ser administrados por qualquer pessoa, mesmo sem qualificação, capacitação, preparo ou experiência, mesmo não vinculada a nenhum organismo de controle e fiscalização de suas atividades profissionais, e mesmo sem dever de obediência a qualquer código de ética que protegeria as partes atendidas.

Numa intenção manifestamente odiosa e discriminatória, amesquinhou-se a figura do mediador autônomo ou vinculado a câmaras, centros ou entidades privadas ligadas à prática dos métodos alternativos de resolução de conflitos, considerando-o como profissional de segunda categoria. Inegavelmente, afrontou-se preceitos já editados, de reconhecimento da influência da mediação extrajudicial, como o que se nota na Recomendação nº 50/2014, do Conselho Nacional de Justiça que aconselha aos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais, o acompanhamento da  satisfação do jurisdicionado nos encaminhamentos de feitos a mediadores judiciais, nos termos da Resolução n. 125/2010, do CNJ, e a mediadores privados, nos termos do art. 139 do CPC, que vigia à época.

Sobre esse desvio da lógica e do bom senso, tive oportunidade de escrever, alhures, que,  com toda certeza, não se poderia conceber que magistrados de primeiro e segundo graus, encaminhassem processos à mediação extrajudicial conduzida por “qualquer pessoa”, sem conhecimento de técnicas de mediação, ao invés de fazê-lo a mediadores privados, registrados, capacitados, titulados com reciclagem e aperfeiçoamento permanentes, qualidades reclamadas pela citada Resolução nº 125 para aqueles com atuação na mediação judicial.

Em agosto de 2016, participei, no Conselho da Justiça Federal, em Brasilia, da I Jornada “Prevenção e solução extrajudicial de litígios”, onde foram analisados e aprovados 47 Enunciados sobre Mediação. Tendo em vista a importância do assunto pertinente à formação do mediador, foram apresentadas três propostas de enunciados: o primeiro, dizendo que “o mediador extrajudicial deverá ser capacitado especificamente para a prática da mediação, não bastando conhecimentos em outras áreas do saber que guardem relação com o mérito do conflito”; o segundo, assim redigido: “A capacitação do mediador extrajudicial de que trata o art. 9° da Lei de Mediação deve atender aos parâmetros curriculares estabelecidos pelo CNJ”;  e o terceiro estabelecendo que “A capacitação do mediador privado prevista no art. 9° ( da Lei de Mediação ), significa que deve ter vocação, reputação ilibada, confiança dos envolvidos e aptidão para mediar, não sendo necessário certificado de conclusão de curso, conforme os parâmetros fixados pelo Conselho Nacional de Justiça e Ministério da Justiça, exigência que se destina a mediadores judicias; sendo, porém, recomendável que tenha acesso a cursos que lhe propiciem acesso aos princípios orientadores da mediação e o aperfeiçoamento constante das técnicas

Tais propostas foram rejeitadas em votação ocorrida na Comissão de Trabalho (Grupo II-Mediação). Como a matéria foi, sem dúvida, a mais polêmica e controvertida entre todas as demais apresentadas naquele simpósio, levou-se a sua discussão para a Sessão Plenária onde, após intensos e calorosos debates chegou-se  à aprovação de um Enunciado (n° 47) que buscou contemplar as três outras propostas anteriormente rejeitada e que ficou assim inscrito: “A menção à capacitação do mediador extrajudicial, prevista no art. 9° da lei 13.140, indica que ele deve ter experiência, vocação, confiança dos envolvidos e aptidão para mediar, bem como conhecimento dos fundamentos da mediação, não bastando a formação em outras áreas do saber que guardem relação com o mérito do conflito”.

Embora o ideal, justo e racional,  seria o acolhimento da proposta que estendia ao mediador extrajudicial as mesmas exigências previstas para o mediador judicial, o referido Enunciado 47 constitui um mal menor frente ao mal absoluto do texto da lei.

Da pesquisa do tema, no cenário de 66 países, verificou-se que naqueles onde a utilização da mediação de há muito já se encontra sedimentada e com larga tradição na prestação dos serviços correspondentes, a formação e a capacitação dos mediadores, sempre foram exigidas, não se admitindo o exercício de tão importante função por pessoas desprovidas de conhecimentos e habilidades específicas. Na maioria desses países se reclama, ainda, do mediador, para o seu credenciamento e qualificação, frequência a cursos de aperfeiçoamento, reciclagem e treinamento contínuos, ministrados e desenvolvidos por centros, câmaras ou entidades estatais ou privadas. Segundo algumas normatizações, a mediação é considerada inválida quando feita por pessoas não credenciadas e devidamente registradas naqueles organismos voltados à administração dos métodos alternativos de resolução de controvérsias.

Para se ter uma ideia sobre a consideração que certas nações dispensam à figura do mediador e o cuidado que tomam em relação a responsabilidade desse profissional, na Áustria impõe-se, para o seu credenciamento, entre outros requisitos, a contratação de um seguro de responsabilidade civil, pelos danos que possa causar em decorrência da sua atividade, com montante mínimo de cobertura de 400.000 euros, sem limite de tempo e com responsabilidade subsidiária da seguradora. Também, em termos de garantia e responsabilidade, na Itália, para o registro do mediador, é essencial a comprovação da sua estrutura financeira, exigindo-se que o requerente tenha um capital social não inferior à quantia necessária para o estabelecimento de uma sociedade de responsabilidade limitada, bem como a posse de uma apólice de seguros não inferior a 500.000 euros, para garantir o ressarcimento de danos decorrentes de qualquer erro no desenvolvimento da mediação.

E no Brasil, qualquer pessoa, desde que civilmente capaz,  pode exercer a função de mediador.

A obrigatoriedade de o mediador ser advogado parece estar prevista apenas no sistema de mediação da Argentina e da Índia,

Em alguns países, a mediação judicial tem natureza incidental, se realizando no curso da demanda ajuizada. Na Bélgica, por exemplo, o juiz, por iniciativa própria ou a pedido de uma ou de ambas as partes (não é necessário o acordo entre elas), nomeia um mediador profissional, credenciado pela Comissão Federal de Mediação, que interfere no processo  em qualquer das suas fases, sendo que nos litígios de divórcio, invariavelmente, o magistrado recomenda a mediação para a obtenção de uma reconciliação ou um acordo que satisfaça a ambas as partes.

Registra-se uma curiosidade: na China a mediação judicial é conduzida pelos próprios juízes que estão comprometidos com um duplo papel no gerencimento de uma mesma causa: o de julgador e mediador, daí se compreendendo que a mediação judicial não é, estritamente, um mecanismo de resolução alternativa de conflitos, mas uma parte integrante e importante do contencioso.

Se na maioria dos países a mediação judicial é feita nos tribunais ou nas cortes anexas a eles, no Líbano os tribunais é que encaminham às entidades não estatatais e que operam o sistema, os casos ajuizados e passíveis de serem solucionados pela mediação. Na Lituânia, a lista de mediadores que administram a mediação judicial é composta por  juízes, assistentes jurídicos, advogados, membros do departamento de proteção à criança, psicólogos e educadores.

A mediação extrajudicial ou privada, é feita, universalmente, fora dos tribunais, por mediadores autônomos ou ligados a organismos ou instituções privadas que prestam os serviços correspondentes. Essa mediação pode ser realizada assim que eclodir o conflito, antes do seu endereçamento às vias judiciais ou arbitrais, como pode ser utilizada incidentalmente nas demandas já ajuizadas, neste caso, até o momento que antecede à prolação da sentença.

Em grande número de nações a mediação extrajudicial é vista como uma pré-mediação. Em países como a Inglaterra, há organismos de mediação familiar que prestam serviços através de mediadores treinados para auxiliar casais que se separam, a alcançar um acordo que resolva disputas sem necessidade de se recorrer à Justiça. Se a mediação não lograr êxito as partes podem socorrer-se do Judiciário, provando, entretanto, que tentaram, anteriormente, resolver o litígio pela mediação extrajudicial.

A mediação prévia obrigatória, como condição de admissibilidade da apresentação de demandas às vias judiciais, principalmente dos conflitos familiares, é providência que se encontra presente na maioria dos regulamentos que disciplinam o instituto no mundo.

Na Argentina, segundo a legislação nacional, instituiu-se, com caráter obrigatório, a mediação prévia, incidente em todos os processos em tramitação no sistema judicial, impondo a comunicação direta entre as partes para a solução extrajudicial de toda questão controvertida. Segundo as leis de algumas províncias como as de Catamarca, Corrientes, San Luis, Santa Fé e Tucumán, adotou-se a mediação prévia obrigatória judicial quando as disputas dizem respeito a questões cíveis e comerciais, reservando-se a mediação voluntária extrajudicial, para os casos que envolvem os conflitos escolares, comunitários, trabalhistas, criminais de delitos de ação privada, e outros especificamente discriminados.

É interessante observar que, nada obstante a previsão da compulsão ou obrigatoriedade na legislação federal da Argentina, a Constituição da Cidade Autônoma de Buenos Aires, no seu art. 106, declara que compete ao Poder Judiciário local organizar a mediação voluntária.

Na Itália, antes do ajuizamento de demandas relativas a condomínio, direitos reais, divisão, sucessão hereditária, pactos de família, locação, comodato, ressarcimento de danos decorrentes de responsabilidade médica e sanitária, acidentes de trânsito, contratos de seguro, bancário e financeiro, bem como ações penais por difamação veiculada pela imprensa ou por qualquer outro meio de comunicação, a parte deve, assistida por advogado, submeter o conflito à mediação.

Quando se fala em mediação obrigatória não se está referindo à obrigatoriedade da utilização do método, como via única  e compulsiva,  em substituição às instâncias judiciais ou arbitrais, pois se assim fosse , as partes não teriam a motivação suficiente para chegar a uma solução negociada e estaria sendo violentado o princípio da voluntariedade, ponto fundamental da mediação. Assim, o que é obrigatória, é a tentativa de mediação, eligida como requisito prévio  para  a apreciação da demanda.

Ainda na Itália, o advogado deve informar ao cliente, por escrito, sobre a obrigatoriedade da tentativa de mediação e que ela constitui condição de admissibilidade do processo judicial, sendo que o documento contendo a informação deverá ser anexado ao pedido de qualquer ação judicial. Será considerada satisfeita a condição de admissibilidade do processo judicial se a tentativa de mediação terminar sem qualquer acordo entre as partes.

No desenvolver do trabalho percebeu-se que no tratamento dispensado a esse método de resolução de controvérsias pelos países objeto de investigação, há uma certa uniformidade relativamente ao processo, e  as regras universalmente aceitas não variam muito, da escolha do mediador e o início do procedimento, até a conclusão deste com a elaboração do acordo e a sua homologação em juízo, para revestir-se da mesma força e possuir o mesmo efeito de uma sentença judicial.

Isso se deve, seguramente, à transposição, para as legislações ou normas nacionais, de regras constantes da Lei Modelo sobre Conciliação, adotada pela UNCITRAL – Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional, e da Directiva 2008/52/CE, nada obstante a primeira tratar somente da conciliação comercial internacional, e a segunda, da mediação, civil e comercial, de conflitos transfronteiriços.

Invariavelmente são inscritas, nos regulamentos dos países, regras uniformes sobre a possibilidade de o mediador se comunicar com as partes em conjunto ou individualmente (caucus) para  melhor entender os problemas que afetam aqueles mediandos que, ouvidos separadamente, se revelam mais abertos e desprovidos de freios e constrangimentos.

Na maioria dos países a intervenção dos advogados no processo de mediação é facultativa, ou seja, as partes podem ser assistidas por esses profissionais. A obrigatoriedade de os mediadores se fazerem representar por advogados, parece existir apenas na Argentina e na Inglaterra. No Brasil os mediandos poderão ser assistidos por advogados ou defensores públicos, mas se uma  das partes comparecer acompanhada de advogado ou defensor público, o mediador suspenderá o procedimento, até que todas estejam devidamente assistidas. Na Irlanda, o tribunal designa um advogado para atuar como mediador, se as parte discordarem quanto a escolha de um condutor do procedimento.

Quase sempre, a data do início do procedimento, ou seja, o dia em que ocorre a primeira reunião entre o mediador e os participantes, é  que irá  interromper os prazos prescricionais, que recomeçam ou são retomados, pelo prazo restante, a partir do momento em que se encerra a mediação sem obtenção de acordo.

Em alguns países como Portugal, por exemplo, se detalha melhor a questão da retomada do prazo prescricional, onde ela (a retomada) se sucede com a conclusão do procedimento motivada por recusa das partes em prossegui-lo, ou pelo esgotamento do prazo máximo de duração do processo, ou ainda, quando o mediador determina o final da mediação.

Se na  Bulgária não há previsão sobre a data final da mediação ou quando exatamente os prazos de prescrição, suspensos, voltam a fluir, na Bélgica  a suspensão expira-se 30 dias depois da   notificação, por carta registrada,  por uma das partes ou pelo mediador à parte contrária, do seu desejo de não prosseguir com o sistema.

O prazo de duração do processo pouco varia nos países que regulamentam esse assunto. Na França e em Portugal é de 3 meses; na Itália, na Rússia e na Sérvia não pode ultrapassar 120 dias. De se anotar que esses prazos podem ser prorrogados desde que haja consenso entre as partes.

A causa mais frequente do encerramento da mediação, como não poderia deixar de ser, é o que diz respeito ao término do procedimento por haverem as partes alcançado um acordo, pondo fim ao conflito. Mas ela se conclui também, quando se frustra a aplicação do sistema e não se obtém qualquer acordo,   quando o mediador entende ser inviável o método, quando um das partes ou ambas desistem do processo ou, ainda, quando falece qualquer dos conflitantes. Há regulamentos, como o da Espanha, que além dessas causas, prevê o término da mediação quando as partes, de comum acordo, resolvem submeter a questão à arbitragem, e o de Gana que estabelece que o mediador deve encerrar o processo em razão da não efetivação dos depósitos prévio e suplementar, exigidos para a cobertura das despesas da mediação. Na Indonésia, na mediação judicial, o mediador é obrigado a concluir o processo se entender que a disputa envolve ativos ou outros interesses de outras pessoas que não fazem parte da relação processual.

A homologação judicial do acordo geralmente é facultativa, dependendo do interesse e vontade das partes de emprestar maior liquidez e certeza à convenção que celebram. Entrementes, na Argentina a homologação é obrigatória se a controvérsia envolver interesses de menores e de incapazes. Invariavelmente os acordos, uma vez homologados, revestem-se de força executiva. É de se anotar que esses acordos que põem fim às disputas civis ou comerciais, quer sejam celebrados no país, quer em outra nação da União Europeia, gozam de força executiva não só internamente quanto em qualquer outro Estado que dela faz parte, por força da Diretiva 2008/52, aplicável  nos países que compõem aquela União.

Nos países onde a prestação dos serviços de mediação não é gratuita, os honorários do mediador, as taxas, custas e demais despesas que englobam o custo final do processo, são sempre divididos entre as partes proporcionalmente.

Na Alemanha não há nenhuma regulamentação sobre honorários e custos da mediação; os honorários são estabelecidos levando-se em conta a atuação do mediador por tempo de trabalho, havendo uma estimativa de remuneração entre 80 e 250 euros, por hora.

Em muitos países os honorários são fixados de conformidade com tabela prevista em Anexos da legislação que regulamenta o instituto, com é o caso da Argentina onde a remuneração do mediador varia de 300 a 2.000 pesos, nas causas de valor entre 3.000 a 100.000 pesos, cobrando-se acima desse valor 2% limitada a cobrança a 12.000 pesos e nas causa de valor indeterminado, 1.400 pesos. Ainda segundo a  legislação argentina, nos processos de mediação familiar os honorários básicos do mediador giram em torno de 900 pesos. No Canadá, os mediadores, voluntários, percebem honorários equivalentes a 75 dólares por sessão que, geralmente, é realizada em duas horas. Já na Holanda, o  custo varia de acordo com a maior ou menor complexidade da disputa. O mediador é remunerado por hora de trabalho e, assim, os seus honorários são fixados com base no número de sessões e na duração de cada uma. Fatores como tipo de conflito, empatia dos participantes e vontade de negociar, têm influência  no tempo de duração do processo, realizando-se, em média, três a cinco sessões de duas a três horas, para se concluir a mediação. Na Índia, os honorários do mediador são fixados pelo tribunal, após consultá-lo e ouvir as partes. Havendo dois mediadores, o valor das remunerações será repartido entre eles, em partes iguais.

Com referência às questões de família, na Bélgica os custos da mediação, judicial ou voluntária, bem com os honorários do mediador são  suportados pelo Judiciário. Na Inglaterra, o preço de uma mediação familiar varia de acordo com os serviços desenvolvidos. Os honorários são exigidos ou por hora de trabalho ou com base em tabela fixa, por hora. O mediador deve informar às partes os custos prováveis da mediação e a sua forma de pagamento.

Se na grande maioria dos países a remuneração dos mediadores é prevista e regulamentada por leis ou atos normativos estatais, em outras nações, a matéria é disiciplinada em normas internas de organismos e instituições privadas voltadas à mediação, como é o caso do Egito, El Salvador, Equador, Jamaica , Nigéria e Suíça.   

Na França o procedimento é inteiramente gratuito e somente os honorários advocatícios são devidos pelos mediados; se os recursos pessoais dos envolvidos forem insuficientes, poderão, tanto a vítima como o agressor, pedir apoio judiciário para a remuneração aos advogados.

É interessante ressaltar que, no México , o procedimento relativo à  mediação pública  é inteiramente gratuito, não existindo previsão de cobrança de taxas, custas e demais despesas. Os mediadores recebem uma remuneração pelos trabalhos executados e estão impedidos de cobrar qualquer importância pelas suas atuações. De outra parte, na mediação privada, o mediador ajustará previamente com os mediandos os seus honorários. O mediador privado, segundo determina a legislação, deve prestar serviços pro bono (gratuitamente)  quando uma ou ambas as partes carecer de recursos econômicos.

Parece não existir no mundo, país que não conta com entidades, organismos, instituições e centros não estatais voltados à mediação.

Em muitas nações, essas organizações privadas, além de prestar serviços de resolução de conflitos através da mediação e da arbitragem, e de aconselhamento, principalmente nas disputas familiares, se ocupam também de formar, capacitar, credenciar e controlar as atividades dos mediadores, instituindo regras próprias tanto para desenvolver o procedimento quanto para disciplinar os cursos e programas dirigidos à qualificação profissional daqueles que irão gerenciar o processo de mediação.

Citam-se, entre esses países a Austrália, Estados Unidos, Hungria, Inglaterra, Irlanda, Israel, Japão, Noruega e Uruguai, entre outras.

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* O texto acima é  um breve resumo da defesa pública da tese intitulada “Temas de Mediação no Direito Comparado – a mediação em 66 países”, recentemente apresentada em Buenos Aires – Argentina, para obtenção do Título de Executive Master de Estudios Avanzados em Mediación y Negociación.

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