O sonho da casa própria norteia a vida de muitos brasileiros, assim como o desejo da aquisição de um imóvel para instalação de um negócio, bem como a necessidade de uma locação para fixação de residência, negócios imobiliários presentes no dia a dia da sociedade.
Negócios complexos ou simples, de igual modo requerem certos cuidados para que todo o processo se desenvolva da forma correta e atinja a conclusão almejada.
Nesse cenário, os personagens não só se deparam com uma série de contratos, variáveis na negociação, múltiplos interesses, que ora convergem, ora divergem, mas também se deparam com uma grande ansiedade e expectativas, que por vezes podem comprometer a conclusão do negócio.
Ultrapassada a fase das tratativas e concluído o negócio, as relações até então originadas do referido negócio imobiliário, se prolongam no tempo e no decorrer de sua execução, novos personagens podem surgir, novas relações podem nascer e consequentemente, novas situações podem ocasionar problemas com os quais os atores originários não contavam.
É nesse momento que se colocam à prova àquelas emoções antes mencionadas – ansiedade e expectativa – que podem dar lugar à divergência, desentendimentos e insegurança.
O quadro aqui desenhado pode parecer mais um folhetim, mas não. Em verdade, nos deparamos com essas situações – inicialmente, consolidadas num ambiente pacífico e de pleno acordo entre as partes e que após transcurso de tempo, ganha contornos de conflitos imensuráveis – no âmbito do mercado imobiliário.
Justamente por ser um ramo que envolve múltiplos personagens e variados fatores influentes, se revela inevitável à ocorrência de múltiplos conflitos, surgindo o questionamento: qual a melhor forma de resolução de conflito instaurado no âmbito do mercado imobiliário?
Num primeiro impulso, a parte interessada faz um contato, extremamente envolvida pessoalmente na relação e crente no resultado positivo do diálogo buscado, inicia uma tentativa de negociação direta e informal. A título de ilustração: o locatário que liga para o locador para fazer cobrança ou para reclamar sobre as condições do imóvel locado, o adquirente que tenta resolver junto à construtora uma infiltração no imóvel novo, um condômino que reclama do outro condômino junto ao síndico, o síndico que busca alertar pelo interfone ou através de abordagem na portaria aquele condômino que viola as disposições da convenção condominial e etc…
O conflito é natural do ser humano e por isso tão presente no ambiente imobiliário.
Contudo, o que se observa é uma inquietude emocional que compromete a negociação justamente em razão do envolvimento das partes, o que faz com que essa negociação direta e informal não alcance o objetivo e acaba por comprometer o resultado e agravar a situação, com o esgotamento dos ânimos e disposição das partes.
Até então, após essa negociação direta e informal – frustrada – tínhamos dois caminhos: aceitar e conviver com a frustração, administrando os ânimos e amargando verdadeiro desgaste emocional e até prejuízo financeiro ou judicializar a relação recorrendo ao Poder Judiciário.
Contudo, ainda que a passos lentos, é perceptível que essas não são as únicas alternativas. Para a resolução de conflitos imobiliários temos à nossa disposição a arbitragem e a mediação, que se apresentam no cenário atual como opções mais eficientes e menos custosas para as partes.
Considerando a existência de várias partes, o envolvimento emocional e os conflitos decorrentes dos negócios imobiliários, podemos afirmar que a mediação se mostra como instrumento adequado para estabilizar a relação e resolver a controvérsia instaurada.
Isto porque, o instituto ganhou tratamento especial no CPC – lei 13.105/15 – e também encontrou lugar em nossa legislação – lei 13.140/15 – revelando-se como método rápido, econômico e de resultados eficientes, já que as próprias partes podem escolher seu mediador e conduzir as negociações.
Enquanto, indiscutivelmente, se instaurada a controvérsia no âmbito judiciário a demanda se arrasta morosamente e se prorroga no tempo, com o resultado limitado e aplicado tão somente para declarar um vencido e vencedor – sem que, necessariamente, se resolva, de fato, o conflito – a mediação atende o objetivo primordial que é a pacificação.
O método se difere dos demais – conciliação e arbitragem – e se revela genuinamente como pacificador, na medida em que é uma negociação assistida, por pessoa capacitada, dissociada da disputa e das partes envolvidas, que desenvolve um procedimento hábil para identificar a origem do problema, com foco somente nas questões que interessam para as partes, sob a ótica de múltiplas possibilidades de soluções, com o intuito único de realizar um acordo igualmente satisfatório para todos os personagens envolvidos.
Por se tratar de um processo voluntário, caso as partes não alcancem a composição, o caminho do Poder Judiciário continuará a ser uma opção. Não obstante, se as partes transigirem, haverá um efeito vinculante.
As situações que se mostram adequadas a recorrer à mediação são aquelas que decorrem de relações que se prolongam no tempo, de trato sucessivo, com várias partes e com relevante envolvimento emocional, uma vez que o procedimento busca atender os reais interesses das partes envolvidas, enquanto nos procedimentos em que as partes se posicionam como verdadeiros adversários, apenas se decide o direito, o que, por vezes, não se revela suficiente para acalma os ânimos.
Como em toda relação, há de se guardar a boa-fé e as partes envolvidas devem ter vontade de negociar e alcançar um acordo que seja benéfico e mútuo. Para tanto, a mediação propicia inúmeros benefícios, de suma importância e utilidade, como agilidade, economia, soluções mais eficazes e inovadoras, controle do resultado, confidencialidade, informação e preservação do relacionamento.
É inegável que se trata de um procedimento célere que, além de traduzir em menor tempo a solução do problema, também repercute no seu custo, uma vez que normalmente se cobra por hora e o valor costuma a ser dividido entre as partes. Outro custo que, apesar de não ser pecuniário, se revela tão importante quanto, é o custo emocional. Com a celeridade, as partes envolvidas sofrem menos desgastes e tiram melhor proveito de um dos bens mais escassos atualmente, o tempo útil.
A atuação ativa das partes e por outro lado, a participação imparcial do mediador, permite que as soluções sejam feitas sob medida – sem a imposição de um terceiro -, acarretando a percepção de um procedimento justo e satisfatório. Aquele que melhor conhece o problema, propõe a solução, atraindo a eficácia almejada.
Apesar de ser um processo reconhecido e amplamente utilizado, com alto nível de sucesso, em vários países do mundo, como Estados Unidos, França, Inglaterra e a nossa vizinha Argentina, em nosso país, ainda que há pelo menos 2 décadas, a mediação já vinha sendo praticada através de iniciativas privadas e algumas iniciativas públicas, apenas recentemente, a mediação foi “institucionalizada” e ganhou contornos de política pública. Grande impulso propagado pelo nosso CPC.
Especificamente no mercado imobiliário, ganha espaço e se aceita com maior naturalidade a inclusão em contratos de cláusulas prevendo, prioritariamente, a mediação como método de resolução de conflito.
Para tanto, faz-se necessário a divulgação e desenvolvimento das mediações privadas e pré-processuais, revelando-se o mercado imobiliário um importante campo para disseminar o procedimento, considerando o contingente de pessoas envolvidas e as relações complexas presentes no cotidiano da sociedade, funcionando como verdadeiro instrumento para desafogar o Poder Judiciário.
Nesse sentido, importante a conscientização da sociedade de que a judicialização das questões não é a melhor saída e que o amparo de advogados, imobiliárias e administradoras de imóveis durante as etapas iniciais das transações diminuem a possibilidade de conflitos decorrentes do negócio e que, mesmo ocorrendo, a mediação se revela como um instrumento eficaz para dirimir conflitos e pacificar os ânimos, preservando o negócio.
Isso permitirá a estabilização do mercado imobiliário e a segurança que as partes almejam nos negócios, acarretando inevitavelmente a lucratividade que se espera de um mercado sólido e estável.
Por Francine Barreto, sócia do Vieira, Cruz Advogados, especialista em direito do consumidor e recuperação de créditos, com enfoque no setor imobiliário, pós-graduada em Direito Imobiliário pela Universidade Cândido Mendes.
Fonte: Migalhas – sexta-feira, 11 de janeiro de 2019
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